Pesquisadores europeus anunciaram nesta quinta-feira que encontraram
“poderosos” anticorpos que são capazes de “neutralizar” o zika vírus,
uma descoberta que abre caminho para uma vacina contra esse patógeno que
está relacionado a uma série de problemas de saúde.
Os anticorpos permitiram “neutralizar eficientemente” o zika e o
vírus da dengue em testes com células humanas realizados em laboratório,
o que “poderia levar ao desenvolvimento de uma vacina universal” que
protegeria contra as duas doenças, indicaram os pesquisadores na revista
científica Nature.
Esta descoberta coincide com um outro estudo, também publicado nesta
quinta-feira, que sugere que a recente explosão de casos de zika vírus
na América Latina poderia ter sido favorecida por uma pré-exposição à
dengue.
Os dois vírus têm vários aspectos em comum. Pertencem à família dos flavovírus, transmitidos especialmente por mosquitos.
Pesquisadores do Instituto Pasteur de Paris, do Centro Nacional para a
Pesquisa Científica (CNRS) francês e do Imperial College de Londres,
que já estudavam os anticorpos capazes de combater a dengue, passaram a
analisar igualmente o zika vírus.
Eles selecionaram dois anticorpos EDE capazes de deter a dengue e
descobriram que um deles era particularmente eficaz para neutralizar o
vírus da zika.
A descoberta, segundo Félix Rey, responsável pelo laboratório de
virologia estrutural do Instituto Pasteur, que dirigiu o estudo, foi
“totalmente inesperada”.
A partir daí, com diversas técnicas, os pesquisadores conseguiram
reconstituir o local preciso onde este anticorpo se fixa sobre a
proteína que envolve o zika vírus e descobriram que o local de fixação
era o mesmo do vírus da dengue.
“Esta descoberta permite trabalhar na produção de uma vacina de
proteção contra todos os vírus do grupo”, afirmam os pesquisadores no
estudo.
De acordo com Juthathip Mongkolsapaya, outro pesquisador, trata-se
dos “primeiros anticorpos muito poderosos” descobertos contra o zika, um
vírus considerado por muito tempo como pouco perigoso.
Mas a epidemia que atinge os países da América do Sul, especialmente o
Brasil, revelou estar associada a graves anomalias no desenvolvimento
cerebral, principalmente à microcefalia – malformação que se caracteriza
por um tamanho abaixo da média da cabeça de bebês de mães infectadas
com o zika.
No Brasil, o país mais afetado, foram registrados 1.616 casos de
microcefalia desde o início da epidemia de zika, em outubro passado,
segundo dados do Ministério da Saúde.
A zika está associada, ainda, a complicações neurológicas, como a
síndrome de Guillain-Barré, que pode causar paralisia e levar à morte.
Na quarta-feira, pesquisadores da USP em Ribeirão Preto publicaram um
estudo revelando que o vírus da zika também causa uma inflamação ocular
grave em adultos, chamada uveíte, cujas complicações incluem glaucoma e
catarata. Até então, acreditava-se que o vírus só causasse inflamações
superficiais, como a conjuntivite.
Em fevereiro, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou uma
“emergência de saúde pública de nível internacional” em razão do aumento
de casos de infecção pelo zika vírus em vários países e das
complicações associadas à doença.
Até o momento não existe nenhuma vacina contra o zika, ao contrário
da dengue, que já dispõe de uma vacina desenvolvida pelo laboratório
francês Sanofi.
A dengue, que assim como o zika é transmitida pelo mosquito Aedes
aegypti, está em plena expansão em regiões tropicais e subtropicais do
planeta, onde cerca de 400 milhões de pessoas são contaminadas por ano.
Os sintomas da dengue incluem febre, dor de cabeça, náusea, vômito e dor muscular.
Zika agravado pela dengue
Outro estudo, realizado pelos mesmo pesquisadores e também
publicado nesta quinta-feira pela revista Nature Immunology, revela que a
maioria dos anticorpos produzidos por pessoas infectadas pela dengue
podem aumentar a potência da zika.
Isso significa que uma exposição anterior ao vírus da dengue “pode
acentuar a infecção pelo zika”, disse Gavin Screaton, Imperial College,
um dos autores do estudo.
“Este pode ser o motivo pelo qual o surto atual é tão severo, e
porque ele aconteceu em áreas onde a dengue é prevalente”, como a
América Latina, completa o pesquisador.
A descoberta mostra a importância de que uma futura vacina contra o zika utilize os anticorpos corretos, disse Rey.
No entanto, ressalta o pesquisador, ainda há muito trabalho por
diante, como a realização de uma pesquisa clínica, que pode levar muito
tempo.
Em relação à vacina do Sanofi, que combate as quatro variedades
existentes da dengue, Rey afirma que esta “teria que ser modificada para
poder ser utilizada contra o zika”.
Segundo Jeremy Farrar, diretor da organização britânica Wellcome
Trust, que apoiou financeiramente ambos os estudos, ainda “há mais
perguntas que respostas” sobre o zika e o grupo de vírus que inclui a
dengue.
Resta saber, por exemplo, porque o vírus da zika no sudeste asiático e
na África, onde está presente há muito tempo, não se desenvolveu da
mesma forma que na América do Sul.
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